sábado, 14 de julho de 2012

Desafios para o Marketing na escola

Falar sobre marketing para estudantes de graduação é antes de tudo, desafiador. É um desafio, porque a maior parte deles, além de desconhecer e confundir o conceito da matéria não tem o hábito da leitura. Qualquer uma delas. Obrigatoriamente uma disciplina de fundamentos de marketing aborda os conceitos da American Marketing Association, o Marketing Mix, a Pirâmide de Maslow e ferramentas clássicas como a Análise Swot e a Matriz do BCG. Claro, é preciso falar também sobre pesquisa, ainda que seja numa disciplina em separado. Mas os conteúdos vão pouco além dos diferentes métodos de pesquisa e sua aplicação que, em alguns casos, faz interface direta com estatística. Para aqueles que não têm algum background, esses conteúdos simples podem ser um suplício do ponto de vista de sua compreensão. E seguirá sendo, pois que se lhes faltam informações e familiaridade com o principal insumo para qualquer estudo: a leitura. Passo os olhos pelos jornais e me aflijo: essas pessoas estão a anos luz da realidade do marketing. Não, nada tenho contra conceitos e ferramentas básicas. Aprender sobre os quatro Ps é como aprender as quatro operações: vão utilizá-los para sempre em qualquer situação de gestão. É preciso compreender a teoria básica das matérias, não há dúvida. A questão é a escassez da informação e do conhecimento. Na última década o volume e a rapidez com que empresas trocam de donos, avançam sobre países dantes ignorados ou simplesmente quebram e somem do mercado é muito grande. Saber sobre o mercado global não é uma questão só para economistas. É, antes, uma necessidade para TODOS os que estão no mundo do trabalho. Uma simples leitura diária de jornais já pode dar ao trabalhador em 2012, uma visão do cenário local ou mundial de hoje, com perspectivas para o futuro de curto e médio prazo. O sociólogo italiano Domenico De Masi, que fez sucesso nos anos 90/2005 falando sobre O futuro do trabalho e do Ócio criativo, defende a importância de o ser humano trabalhar menos operacionalmente e gastar mais de seu tempo em lazer, compreendendo aí um bom espaço para a leitura e atividades culturais. De Masi lembra em um de seus livros que os romanos, que dominaram o mundo por séculos, fizeram uso das catapultas pelos seus exércitos por mais de cinqüenta anos sem que os bárbaros as copiassem. Era um tempo fácil para o exército e para o marketing romanos. Costumo então lembrar aos estudantes que desde os últimos trinta anos do século XX, nada mais ficou difícil para o concorrente e que, depois de 1990, com o avanço da informática, das comunicações e da ciência em geral, as empresas podem ser esmagadas pelos concorrentes em muito pouco tempo. Numa vacilada em tecnologia, por exemplo, como o notório caso da Kodak, que inclui a falta de visão de futuro. E visão de futuro começa pela leitura. Todo o tipo de leitura e não só aquela técnica, sobre as áreas de trabalho de cada um. Enquanto, numa sala de aula, estudantes tomam contato com a óbvia negociação de gôndolas no grande varejo dos supermercados, empresas já dispõem de tecnologia que permite o monitoramento de retina para entender gostos do consumidor. Desde 2009 pesquisadores da Kimberly-Clark usam computadores com câmeras de monitoramento de retina para testar o que, em suas embalagens, atrai o consumidor. Outras empresas levam o neuromarketing ao extremo e monitoram a atividade cerebral de participantes de testes para descobrir quais imagens geram sensações de prazer. Mas o conhecimento vem da educação de base, um assunto por demais negligenciado na última década pelo governo federal. E a ausência do conhecimento e da informação, claro, resultados da falta da educação para a leitura, afastam esse estudante daqueles mais competitivos. E que não se pense que estamos falando do fato de não conhecerem Michael Porter, Peter Drucker ou Francis Fukuyama, paradigmas da moderna administração. A esses deverão conhecer mesmo na graduação. Eles não lêem nem mesmo livros de aventuras como O senhor dos anéis, Harry Potter ou títulos de auto-ajuda. Mas a questão é mesmo o interesse pelo conhecimento e pela informação, embora isso possa parecer aqui, repetitivo. Eles não trazem esse DNA ou ele está absolutamente adormecido e despertá-lo é uma tarefa extremamente difícil no contexto educacional atual. Nessa perspectiva, as aulas tornam-se muito mais difíceis para eles porque os assuntos abordados lhes são mais estranhos do que deveriam. Faltam-lhes links para os diferentes temas, embora esses estejam quase sempre debaixo de seus narizes, nos seus trabalhos ou nas manchetes do dia, sem que eles percebam. Isso tudo aliado a uma suposta falta de tempo sempre alegada na justificativa de seus compromissos não cumpridos. Enquanto penso em como vencer o desafio de fazê-los leitores, lembro de duas perguntas que faço quando começo a falar de mercado ou de marcas: pergunto se eles se lembram do fato importante para o Brasil que se deu em 1808 e que marcou novos rumos para o nosso comércio. Numa sala de quarenta estudantes, menos de vinte por cento se lembra da Vinda da Família Real e da Abertura dos Portos. Então aproveito a chance e mudo o rumo para um tema mais pop e mais recente: pergunto se sabem quem foi Kurt Cobain. Para essa questão, dos quarenta estudantes, não mais do que dois levantam a mão.