quarta-feira, 30 de junho de 2010

Turismo, empresas e pobreza

Já tratei do tema em palestras, artigos e no meu blog http://jruyveloso.zip.net. Todavia todos os dias me deparo com novos dados sobre de como as grandes empresas vêm agindo nos países pobres buscando novos nichos de mercado que compensem a perda do poder de compra e a fúria da concorrência nos países mais ricos. É dessa forma que alguns investimentos têm sido feitos em países como Indonésia e Bangladesh que acabam se convertendo em empreendimentos de enclave, sem contato com a realidade local, gerando poucos empregos e surfando no turismo sexual com meninos e meninas na faixa dos 14 anos. Um amigo que viajou por essas bandas em 2008 me relatou a exposição até “refinada” de “lady boys”, travestis transformados em meninas já a partir dos 7 anos de idade. E cobram “caro” pelos seus favores sexuais, cerca de US$10... Como resultado as famílias querem transformar seus meninos em “meninas” para vendê-los aos visitantes europeus. Mas essa é uma face do turismo na pobreza destinado a baixa renda do mundo mais desenvolvido. A principal clientela desses resorts é de operários europeus e estadunidenses, os “blue collar”. Agora, além desse tipo de investimento, a indústria de bens de consumo entra pesado no mercado dos pobres. Tentam vender, por exemplo, xampu, cremes faciais e até tênis por preços nunca vistos. A Adidas quer oferecer para os bengaleses que andam descalços um tênis simples por 1 Euro ((R$2,20). A Danone, pressionada na Europa e América do Norte, onde faturou em 2006 US$3,6 bilhões, corre para desenvolver produtos de baixo preço e ganhar no volume de vendas nessas regiões pobres. Com dificuldades de custos no Senegal, onde o leite custa caro e as vacas produzem pouco (3 litros/dia versus 50 litros/dia na França), o desafio é vender iogurte para uma população que gasta em média R$2,00 por dia em comida. O recurso tem sido importar leite em pó barato. O resultado? Quem sabe... Nos anos 1970, quando os primeiros Danone chegaram ao mercado brasileiro a coisa era diferente: densidade e sabor de qualidade com pedaços de frutas como a pêra ou a ameixa. Foram bons e curtos tempos. Hoje o padrão de iogurtes que povoam as gôndolas frias são quase padronizados. E se um laticínio desses regionais tenta colocar no mercado algo melhor é abatido nos PDV pela força econômica dos grandes concorrentes. A questão é que, além (ou pior) do que o turismo sexual ou de exploração de mão-de-obra e etecétera e tal, a indústria avança sobre a pobreza com sofreguidão. Tudo mais ou menos como o clima de “O jardineiro fiel” livro de John Le Carré que virou filme dirigido pelo brasileiro Fernando Meirelles e que vale a pena ver e rever. Para encerrar: um colega meu trabalhou na implantação e desenvolvimento de hospital num país africano. Ganhava bom dinheiro embora viajasse muito. Na última vez que nos encontramos ele me explicou porque saiu daquele trabalho: “os caras começaram a comprar remédios “genéricos” feitos ou embalados no porto de Roterdã, de origem absolutamente duvidosa e que lhes dá um lucro abissal. Não preciso de ganhar dinheiro assim. Sai do negócio.” É assim que o mundo rico trabalha o mundo pobre...

terça-feira, 8 de junho de 2010

Hotéis: cai o luxo

Deu no The Wall Street Journal (via Valor): a rede Four Seasons Hotels & Resorts vai reduzir custos nos seus luxuosos hotéis. Na verdade a pressão vem dos proprietários dos imóveis que têm a marca contratada já que a FSH&R não possui mais hotéis desde que começou a vendê-los nos anos 1980. Hoje são 82 hotéis no mundo sustentando essa cara marca criada em 1961 pelo fundador da rede Isadore Sharp. Em 2009 a taxa de ocupação desses hotéis teria ficado em 57% e a receita por quarto disponível caído 26%. Com uma diária média de US$400, boa parte dos estabelecimentos que ostentam a marca não consegue um bom GOP. Discussões e tensões entre estabelecimentos e marcas administradoras são comuns e depois da crise de 2008, ficaram mais freqüentes. A Four Seasons tem um padrão de luxo como flores frescas todos os dias nos vasos das áreas comuns e nas UH e camareiras que repassam as unidades a cada saída do hóspede independente da arrumação diária. Pois esse luxo vem sendo considerado desnecessário pelos proprietários e acionistas e hoje a rede diminui seu quadro de pessoal dando aos que ficam um treinamento para polivalência e flexibilidade em sua atuação, uma receita de há muito conhecida em toda a indústria hoteleira. A Four Seasons tem hoje novos donos e o fundador, embora seja o Chairman, tem apenas 10% dos negócios. O restante é dividido entre o príncipe saudita Alwaleed Bin Talal que detém 45% e a Cascade Investiment LLC, que pertence a Bill Gates, conforme já tratamos aqui neste Blog. O uso da marca e o modelo de gestão dão a Four Seasons uma taxa aproximada de 3,5% da receita dos hotéis e o valor dos 45% do príncipe saudita foi anunciado à época (2006) em 3,7 bilhões.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Cinema e Turismo

Desde os anos 80, entusiasmado com o sucesso do filme Crocodile Dundee, rodado na Austrália, dirigido por Peter Fairman e estrelado por Paul Hogan e Linda Kozlowski, que se casaram depois do filme, falo e escrevo sobre a importância do cinema para o turismo. Mais recentemente, em 2004, o diretor Alexander Payne nos ofereceu o filme Sideways, que mostra os vinhedos da Califórnia com o maior merchan no varietal Pinot Noir. Ninguém tem dúvida sobre o aumento da demanda para as visitas aos vinhedos da Califórnia pelos estadunidenses e do consumo do Pinot Noir mundo afora.
O cinema sempre foi uma ferramenta de propaganda. Para o bem e para o mal. O recente Lula, o filho do Brasil, por exemplo, foi feito para a campanha eleitoral e não deu muito certo nas bilheterias. Os marqueteiros não se deixaram abater: estão exibindo o filme nos lugares mais ermos que se pode imaginar, no modelo Cinemas, Aspirinas e Urubus. Hitler usou o cinema às pampas e os EUA também, na Segunda Guerra, na Guerra Fria e no tempo do Vietnã.
Temos vários filmes premiados, bons de fato e até indicados para o melhor estrangeiro do Oscar. Mas o tema deles não é para atrair turistas. Vejamos: Central do Brasil, 1998, dirigido por Walter Salles, trata da miséria urbana e do sertão. É um belo road movie, mas não atrai viajantes curiosos. Tropa de Elite, 2007, é outro. O diretor José Padilha fez um bom filme. Mas ele atrai turistas? E Salve Geral? O diretor Sérgio Rezende filmou a matança que o PCC, uma sigla do crime organizado, teria promovido em São Paulo à véspera das eleições para Presidente da República em 2006. Convenhamos, não é nada atrativo.
O cinema voltado para o turismo tem que ter roteiro especificamente feito para isso. Nada como um galã europeu ou estadunidense que vem conhecer o Pantanal, a Amazônia ou praias nordestinas e conhece aqui uma Camila Pitanga ou uma Gisele Itié. Já pensou? Muitas paisagens, mulheres e homens bonitos e sem mostrar periferia ou violência. Um filme de alegrias. Já se falou em financiar o Wood Allen para fazer aqui algo como Vick, Cristina e Barcelona. Por que não? Essa também é uma boa solução. Melhor financiar um filme desses do que botar dinheiro em escolas de samba do Rio de Janeiro, como têm feito alguns estados nordestinos.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Trem Bala: é preciso?

Os jornais têm noticiado os caminhos para a construção do Trem Bala ou o Trem de Alta Velocidade, o TAV. O investimento tem sido visto como temerário pelos potenciais investidores pelo preço dos bilhetes versus o custo do investimento, nada menos do que R$34,6 bilhões. Um dado de grandeza para a comparação do investimento: a usina de Belo Monte é estimada pelo governo em R$19 bilhões e pelas empreiteiras em R$32 bilhões. Cada um que reflita sobre os benefícios de cada um desses investimentos, ressalvadas as questões ambientais e soluções alternativas de geração de energia. Bem, o TAV deverá rodar a 200Km/h e, portanto, cobrirá o trecho de 511Km entre Campinas, Viracopos, São Paulo (Campo de Marte) São José dos Campos, Barra Mansa, Rio de Janeiro (Galeão) em duas horas, descontadas as paradas. Tive a chance de viajar três vezes pela AMTRAK, empresa ferroviária estadunidense, entre Washington e Nova York. Carros muito confortáveis, aquecidos no inverno e refrigerados no verão. Largas poltronas com mesinhas que comportam bem a sua refeição, comprada no “carro Delicatessen” ou o seu laptop que pode ser ligado à tomada. Uma vez fui no carro de luxo, sem muita diferença com a desvantagem de que fica no final do comboio e joga um bocado. Nesse caso o diferencial é a refeição que lhe é servida, nos moldes (melhorado) das companhias aéreas. O AMTRAK, sem barulho e poucas paradas, faz o trecho de 360km Washington/Nova York em 2 horas e 45 minutos. Tem portanto, uma velocidade média de 146Km/h. Se formos levantar os custos de implantação de um e de outro investimento, com certeza, vamos nos deparar com grandes números. Com o trem podemos descer no centro das cidades sem o atropelo de esteiras de bagagem, sem scanner para o corpo e sem aquela distância de até R$100,00 de taxi preso no trânsito com arrastão de sobremesa. Podemos alegar que a AMTRAK está lá nos EUA desde o século 19 melhorando os seus serviços e que nós, que não os temos, devemos começar com um investimento moderno. Vá lá. Mas para que tanta velocidade? Ao final e ao cabo, se forem mesmo 200 quilômetros por hora, não será grande a diferença. As pessoas sabem como se programar e saberão utilizar um trem com menor velocidade analisando os benefícios que ele apresenta em relação aos aviões e aeroportos. Enquanto isso, aí vêm as estatais estrangeiras de olho nesse negócio que terá uma “chave de emergência” no contrato: se a demanda for fraca os investidores poderão baixar as tarifas e, portanto, pagar em maior prazo o financiamento. Do valor de R$34,6 bilhões, o governo brasileiro vai financiar 27,68%, colocar mais 3,46% de participação (Petrobrás, Previ e Cia) enquanto os japoneses ou coreanos ou franceses ou alemães ou muitos deles juntos, colocarão 3,46% e muita tecnologia. O valor teto definido pelo governo para a tarifa a ser cobrada é de R$0,60 por quilômetro, o que dá R$306,60 de Campinas ao Rio de Janeiro. Entre o Campo de Marte (SP) e a estação de Barão de Mauá (RJ) com 412,3km, o valor do bilhete seria de R$247,38, quantias nada competitivas com as empresas aéreas hoje. A vantagem de uma ferrovia normal como a da AMTRAK é que ela dispõe de trilhos e desvios e mantém o transporte de cargas nos períodos em que o tráfego de passageiros é menor, como a noite e finais de semana. Afinal, como podemos conceber uma ferrovia que não transporta cargas? Em qualquer sociedade do mundo, os que estão no topo máximo da pirâmide sempre vão se utilizar de transportes próprios. Por que têm pressa e porque, sabe-se lá, têm preconceitos com o transporte público que, de resto, nem sempre é agradável nos horários de pico. Em Paris, NYC, Berlim ou São Paulo. Esse último, abaixo da crítica. Então é assim: proponho uma concorrência para um trem rápido, de poucas paradas e que possa também transportar cargas. Um modelo AMTRAK já serve. Pode ser também um modelo do TGV francês, senão o meu amigo Hélcio vai dizer que sou americanófilo. Sim, o trem francês é uma boa solução e pode deixar também espaço para carga nos seus trilhos. Tanto faz. O importante é que as empresas venham investir e operar o negócio. Sem que gastemos essa montanha de dinheiro enquanto a saúde a educação soçobram. Por que por enquanto, só sobram idéias para a continuidade do lulismo.

domingo, 16 de maio de 2010

Copa e Olimpíadas: Isso é bom?

Se um estudo técnico com alguma profundidade fosse feito para determinar se é vantajoso para o Brasil fazer os investimentos necessários para os dois mega eventos World Cup 2014 e Rio Olympic Games 2016, provavelmente o resultado seria censurado pelo governo Lula. Não são poucos os casos dos países que receberam grandes eventos que exigem instalações especificas como as Olimpíadas e tiveram decepções na ponta do lápis. Claro, é possível falar do recall que tais eventos dão ao país que os hospeda. Mas será isso o bastante? Indo direto ao ponto: todo esse investimento que o governo fará em instalações resultará num retorno com alguma proporcionalidade para a atividade econômica do turismo? Quantas obras ficarão abandonadas depois dos jogos, como aconteceu no Pan? Claro que a Copa e as Olimpíadas vão gerar empregos nos períodos de suas realizações. Haverá um bom movimento e uma boa receita. Mas será proporcional aos investimentos? Com certeza temos outras prioridades, mesmo no turismo, para ganharmos espaço e recall internacional. Só para lembrar: rodovias boas, aeroportos, ferrovias e...segurança. Por outro lado, um evento do porte das Olimpíadas no Rio soa até como uma provocação. Sim, vai dar certo. Mas a que preço?

domingo, 9 de maio de 2010

Sergio de Paula Santos

No começo dos anos 1980 conhecer vinhos não era ainda uma habilidade que agregava charme aos executivos, pelo menos para a grande maioria deles. À época a Almaden ganhava o mercado nacional tranqüila em razão das altas taxas para a importação de qualquer tipo de produto pelos brasileiros. O SENAC era um dos poucos espaços, senão o único, que oferecia a oportunidade para que os leigos se aproximassem do bálsamo de Baco. Aristides de Oliveira Pacheco, um enólogo autodidata com curso de gestão hoteleira em Lausanne, Suíça, era o colega que fazia a ponte com os enólogos das diferentes bandeiras nacionais e estrangeiras. As publicações sobre o tema inexistiam no Brasil e o seu pioneiro foi um médico otorrino, cinqüentão e viajado que apreciava e conhecia de vinhos para discutir com os enólogos das vinícolas. Era o doutor Sergio de Paula Santos que participava dos eventos, dava sua contribuição e fazia questão de enfatizar que escrevia sobre vinhos porque entendia que o brasileiro deveria se iniciar nesse saudável hábito de uma taça diária da bebida. Depois daquele início de década, Paula Santos lançou mais oito livros, sempre sobre enogastronomia e colecionou palestras, certificados, bons amigos de confraria e, sobretudo, vinhos e livros sobre esses temas: boa comida e bons vinhos. Sergio de Paula Santos deixou esse mundo aos 80 anos no dia 04 de maio de 2010. Os amantes do vinho têm uma dívida para com ele, que foi precursor de um tema sobre o qual muita gente hoje em dia, fala muito e sabe pouco.

terça-feira, 27 de abril de 2010

HABIB´S

O Estadão de 26 de abril trouxe matéria de uma página em seu caderno de “Negócios” sobre o Habib´s, o genuíno fast food brasileiro. O tema vale a matéria e eu escrevi sobre a rede no meu livro “Introdução ao Universo da Hospitalidade”, publicado pela Papirus em 2005. A rede é um produto do empreendedorismo do médico Alberto Saraiva que assumiu a padaria da família num traumático momento quando o pai foi assassinado, vítima de um assalto ao seu estabelecimento. A visão inicial de Saraiva para a padaria foi a de focar no público de menor renda e vender pão barato. Essa visão estratégica nunca mudou e foi o que alavancou a sua rede por todo o país com alta tecnologia na produção de alimentos e rigor na gestão dos franqueados. A matéria mostra um empreendedor centralizador, bem sucedido e que hoje arruma a governança de seus negócios rumo à Bolsa. Os números do Habib´s são impresionantes como, por exemplo, 18 mil empregados e 600 milhões de esfihas por ano. Além disso, ao tentar resolver os próprios problemas acabou por entrar nos negócios de toda a cadeia do fast food e hoje mantém uma indústria de pães e sorvetes (Arabian Bread); uma empresa de Call Center (Voxline) com 2,4 mil empregados prestando serviços para grandes empresas; um laticínio (Promilat) que processa 130 mil litros de leite por dia; uma agência de publicidade (PPM) que faz as peças e campanhas do grupo; uma empresa de arquitetura (Vector 7) que projeta e decora lojas; uma imobiliária (Planej) que trata dos negócios imobiliários do grupo, e uma agência de viajens (Bib´s Tur) que atende o público externo. Pode-se não gostar do jeitão das lojas e dos seus produtos (o pastel português é imbatível e foi uma criação “imposta” pelo Saraiva contra todos os seus colaboradores e que deu certo) mas há de se reconhecer que Alberto Saraiva é um empreendedor que, como Amaro Rolim (in memorian) criou uma empresa que, como a TAM, “tem orgulho de ser brasileira”.